quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Revolução Profilática

Em sociedades oligárquicas onde pequenos grupos de interesse influenciam em demasia o rumo das políticas e manipulam os governos para benefício próprio, o desenvolvimento das instituições não ocorre. E, como mostra uma enorme gama de artigos empíricos surgidos nos anos 90, sem boas instituições (regras estáveis, direitos de propriedade bem definidos para todos na sociedade; ambiente propício à competição, etc), não há crescimento de longo prazo.

Anos atrás, o genial sociólogo-economista Mancur Olson propôs a tese controversa de que revoluções que desestabilizam as elites são boas para o crescimento de longo prazo, dado que elas virtualmente dizimam os grupos de interesse que com o tempo se encastelam no poder e impedem melhoras institucionais e adoções de novas tecnologias (porque essas minam as bases de sua posição privilegiada). Olson até apresenta alguma evidência sugestiva de que os estados norte-americanos mais antigos e estáveis apresentaram por um tempo taxas de crescimento menores que aqueles mais novos, nos quais nenhum grupo de interesse ainda tinha tido tempo para fincar pé e impedir o desenvolvimento.

Em interessante artigo recente que carrega o gérmen da ideia de Olson, Daron Acemoglu e seus co-autores (http://econ-www.mit.edu/files/3951) empregam técnicas estatísticas e estratégia de identificação sofisticadas para avaliar o impacto das invasões napoleônicas no desenvolvimento econômico das regiões européias invadidas. Onde o exército francês pós-revolucionário entrou, ele varreu as oligarquias locais, instalou o uma ordem jurídica nova que chegava a amplas camadas da população, suprimiu os resquícios feudais e as agremiações de ofício que asfixiavam a competição na economia, além de promover os ideais "liberalizantes" da Revolução Francesa. Em suma, indiretamente, a fúria de conquista militar francesa trouxe importantes externalidades positivas para as intituições das regiões invadidas. As consequências?

Nos locais invadidos, a taxa de urbanização (medida indireta de desenvolvimento econômico) posteriormente acelerou-se de modo significativo, em comparação a das regiões que escaparam das garras do general, e também em relação ao seu próprio desempenho prévio. O mesmo resultado diferencial vale para as taxas de crescimento do PIB, mas é importante ressaltar que as medidas de PIB são bem menos precisas para o período em questão.

Enfatize-se que nesse caso não vale a crítica de que na verdade Napoleão decidiu invadir justamente as regiões que já estavam se desenvolvendo mais rápido (a famosa "causalidade reversa"), dado que o que determinava o local a ser atacado não era sua opulência econômica, mas sim suas características geográficas no bojo do plano de expansão territorial e de proteção do território francês.

Uma bela sacolejada exógena no status quo da oligarquia local é assim boa receita para destravar mudanças institucionais pró-desenvolvimento. Mais do que isso, esse achado enfraquece a tese do economista de Harvard, Dani Rodrik, segundo a qual instituições precisam ser germinadas em solo nacional, não podendo ser frutiferamente importadas.

7 comentários:

  1. Com as instutuições que ele traria, Acaua, acho que não ia ajudar muito não

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  2. Achei seu texto muito interessante, mas na minha opinião, o mais viável não é necessariamente a importação de instituições, uma vez que, se isso não acontecer por meio de uma guerra, provavelmente os entrantes terão o apoio da elite local, como pode ser visto ao longo da história brasileira.
    O mais interessante do texto é evidenciar a necessidade de uma reforma institucional para alavancar o crescimento(o que não é exatamente uma novidade), entretanto, mais do que denotar esse fato, o essencial é determinar a maneira pela qual essa mudança é viabilizada. Na minha opinião, para o caso do Brasil, só se fizéssemos uma revolução francesa aqui, mas infelizmente isso é mto díficil.
    Como autor do texto, acho q sua opinião é mto relevante e gostaria de saber como nós podemos realizar essa reforma.
    Atenciosamente.
    Ademir Vilaça

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  3. É bem verdade que uma invasão ou revolução possa ter o efeito de romper instituições que travam o desenvolvimento, mas os problemas são os outros efeitos indesejáveis. Não é possível que outro tipo de fator exógeno possa levar ao mesmo resultado? Algo que induza a cooperação dos agentes que antes não era possível. Uma cenoura, dada no caso de eliminação das travas, que mudaria a percepção de ganho do tomador de decisão.

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  4. O caso da Europa não serve para fazer esse argumento, pois desde o fim do Império Romano houve grande interação institucional entre as diversas cidades-Estado, estados nacionais e outros entes geopolíticos. Ou seja, as instituições dos países europeus se influenciavam mutuamente mesmo sem as invasões napoleônicas, e a literatura de história econômica deixa claro que a competição inter-estados (inclusive no avanço institucional) foi um dos fatores primordiais para a primazia daquele continente.

    O caso das instituições inglesas indo para Austrália, Nova Zelândia e Canadá é muito mais elucidativo. A diferença em relação ao Brasil é que nesses casos a população era bastante homogênea, e previamente adaptada às instituições que se importaram. Na verdade, foram casos de transplante de populações inteiras com instituições e tudo para terras longínquas.

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  5. Carlos Eduardo, eu também publiquei uma coisa sobre o tema no meu blog, se você quiser ver lá, será bem vindo: http://medidasdascoisas.blogspot.com/2009/08/revolucoes-ajudam.html

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  6. Claudema, seguramente não é viável. O achado do Acemoglu não pode ser empregado para formulação de políticas, e sim apenas para constatação do impacto de uma revolução institucional sobre o desenvolvimento.
    A evidência empírica é que grandes reformas só ocorrem após crises severas. Há também a possibilidade de um "political entrepreneur" implementar reformas, mas sou cético quanto a esse canal. Lula não conseguiu ajeitar nem a Previdência, ele que tinha toda credencial para tal..(argumento Nixon in China)

    Pedro, possível é, mas precisa de alguma crise, eu suspeito. Foi assim no Real e no caso RLF/Cambio Flutuante. Com ventos bons, reina a complacência

    Pettersonvale, conheço e gosto do argumento do Mokyr: competição inter-estados facilitando a vida do avanço tecnológico na Europa. Isso por exemplo explica a primazia do Ocidente sobre a China a partir de 1400. Mas não invalida em nada o ponto do Acemoglu, eu acho.

    Michel, vou dar uma olhada

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