sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Credibilidade faz milagre!

A maioria dos economistas associa deflação com péssima performance econômica, contaminados talvez por alguns episódios clássicos onde preços e atividade caíram simultaneamente, como no Japão dos anos 90. Mas a grande verdade é que essa associação é menos robusta do que parece. A curva de Phillips aumentada das expectativas explica porque...

Como mostram os autores do paper Three Great American Disinflations (http://www.nber.org/papers/w12982), tudo depende da credibilidade da política monetária no momento e da velocidade do processo. Na década de 1870, quando os EUA planejavam a volta ao padrão ouro depois da guerra de secessão, os preços declinaram 30% mas a economia cresceu uma média de 5% a.a! O motivo foi o reconhecimento por parte do setor privado que o anúncio de retorno ao padrão-ouro era crível (até porque este era um arranjo monetário muito comum em vários países na época). Além disso, o processo envolveu boa dose de gradualismo.

Já na década de 1920, após a guerra, o retorno ao padrão-ouro trouxe consigo um curto período recessivo. Exatamente no ano de 1920, a atividade desabou. A conjectura dos autores é que isso decorreu não da falta de credibilidade do plano, mas sim da extrema velocidade com que ele foi perseguido. Tanto o anúncio era crível, que em 1921 a atividade já voltara a crescer com vigor, em meio a quedas de preços.

Por fim, a desinflação de Volcker nos anos 1980 gerou tremendos custos para a atividade econômica, como é de conhecimento de todos. Pudera: depois de duas décadas de frouxidão no combate contra a inflação, o anúncio do recém empossado presidente do FED em 1979 de que a inflação retornaria para algo próximo a 3% não soou nada crível. Resultado: inflação realizada em queda com desemprego explosivo.

Uma outra evidência interessante do paper que dá força para a história delineada: usando dados dos mercados futuros de commodities, os autores mostram que os erros de previsão quanto à trajetória dos preços nos episódios de 1870 e 1920 foram muito pequenos (principalmente no de 1870), enquanto os da década de 1980 foram enormes.

Credibilidade de fato faz milagres!

3 comentários:

  1. Carlos,

    na atual queda de braço entre o presidente do BCB e o mercado com relação a estrutura a termo da curva de juros

    caso o mercado esteja certo e o prêmio da estrutura a termo realmente nao estiver exagerado, isso afetaria a credibilidade do BCB?

    abraço,

    Doutrinador

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  2. Olha, eu achei péssima essa falação toda do Meirelles. Dá uma arranhadinha na credibilidade sim.
    O mercado está precificando riscos que são concretos: eleição, fiscal, mudança no comando do BC logo no início de 2010. De fato, é possível que a trajetória futura da Selic seja mais tranquila do que hoje se espera, mas juro futuro é uma combinação de taxas curtas esperadas e premio de alongamento. Esse prêmio está pressionado, e não à toa.

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  3. Prof,

    Concordo que os riscos são concretos: é alto o risco de a inflação subir rapidamente com o fechamento do hiato do produto no ano que vem, juro real inusitadamente baixo, os candidatos favoritos à próxima eleição não são propriamente ortodoxos, deterioração fiscal para o longo prazo, etc. Mas mesmo assim considero o prêmio embutido na curva excessivo. Isso porque: a ociosidade deverá permanecer razoável por bom tempo, não há evidência de inflação importada, a variação dos preços da commodities tem sido neutralizada pela variação cambial, etc.

    Em todo caso, não acredito que o instrumento do grito deva afetar a credibilidade do BC brasileiro. Não tenho tanto conhecimento sobre o tema, mas a simples demonstração de preocupação da autoridade monetária com uma precificação a qual ela julga não condizente com as projeções do próprio BC não tem porque alterar a credibilidade. O Copom já errou diversas vezes, o que é normal, e nada alterou essa percepção. O importante, a meu ver, é manter o compromisso de trabalhar a política monetária para manter a inflação dentro da meta. E isso está sendo feito.

    Abs
    Caio Machado

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